segunda-feira, novembro 02, 2009

DELÍRIOS


– Eu e Woody Allen temos algo em comum. Cremos que o ser humano não é tudo o que imagina e que a vida é constituída de acasos.
– Você e Allen conversam muito?
– Conversamos. Ele pediu meu MSN. A gente papeia virtualmente.
– Em que idioma vocês se comunicam? Inglês, português?
– Não sei inglês e ele não domina o português.
– Então...
– Ele me achou atraente. Viu umas fotos minhas no MySpace. Fotos com a banda. Daquele show em Londres.
– Maria, que banda? Londres? Você nunca foi lá.
– Mas parece que ele vem filmar no Rio. Está animado, me disse.
– É especulação, ainda.
– Não, não. Vou te adiantar uma coisa. Prometa que vai ficar na sua, se não a imprensa começa a me aporrinhar.
– Pode dizer, faço boca de siri.
– O filme já está bem adiantado. Vai ser rodado em 2012. O roteiro só está dependendo de uma resposta minha.
– É?
– Se aceitar o convite dele, o filme caminhará em uma direção. Se não...
– Papel principal. Quero dizer, protagonista?
– Não, ele está apalavrado com a Penélope Cruz.
– Maria, estou preocupado com você. Esses seus delírios...
– Maneco, deixe de ser ciumento. Só tem lugar pra você em meu coração. Preciso aproveitar as oportunidades. Não terei 20 anos pra sempre.
– Maria, há 30 você não tem 20 anos. É uma cinquentona pra lá de bonita, mas...
– Pode não parecer, mas Woody pode ser muito insistente. Ele quer porque quer que eu faça esse filme. Exige que eu pare com a banda. Não quero deixar os garotos na mão.
– Sem sua voz essa banda morre, né?
– Ó a bobeira, Maneco. Sou guitarrista e compositora. Não canto.
– Vou pedir uma pizza, tá legal? As crianças estão dormindo?
– Gostei de saber que ele tem o ser humano em baixa conta. Amo cachorros e gatos. Ele tem um furão.
– Calabresa? Vou olhar as crianças.
– Ethan Coen também tem um furão.
– As meninas não estão no quarto.
– Mamãe esteve aqui. Ela ainda não se conformou de eu ter vindo morar com você. Não aceita que nos amamos, que eu não podia continuar naquela aldeia. As chances estão aqui.
– Ela deve ter levado as meninas. Ligo pra ela, peço a pizza e volto pra ouvir suas histórias. Há vinte anos não faço outra coisa. Pior que não imagino vida melhor do que esta, com você.

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