Fotografar já foi mais trabalhoso para amadores e profissionais.
Amadores tinham à disposição máquinas com poucos recursos, lente fixa, flash de
pouca potência e espaço reduzido para manobras artísticas. Profissionais
possuíam máquinas poderosas, lentes intercambiáveis, flashes poderosos e
recursos técnicos que lhes permitiam fazer imagens primorosas. Precisavam,
também, de um caminhão para transportar o material de trabalho.
No presente artigo, interessa-nos, principalmente, o fotógrafo
amador. Não é o caso de Selio Moraes, um profissional respeitado, que será
usado como ilustração do notável progresso da fotografia nos últimos anos.
Selio fotografava eventos de um grupo religioso que se espalhava
pelo Brasil. Viajava de Norte a Sul do país para desenvolver seu trabalho.
Carregava o próprio equipamento no braço, que constava de dezenas de rolos de
filmes, máquinas fotográficas, flashes, lentes etc. Precisava contar com a sorte
de encontrar, na cidade onde se realizaria o evento, uma boa loja de revelação
de fotos que fizesse serviço de qualidade e trabalhasse com rapidez.
Nos eventos Selio precisava “maximizar” seus rendimentos. O
contratante lhe pagava, mas uma fonte de renda complementar vinha dos
participantes que gostavam de comprar fotos em que apareciam e cenas marcantes
do evento. Essas reuniões duravam de dois dias a uma semana. Selio, dedo
nervoso, fazia centenas de fotos, que depois de reveladas eram expostas para
venda. Precisava contratar auxiliares (as fotos eram fixadas em paredes, à
disposição dos clientes, e havia a necessidade de gente para vendê-las,
enquanto Selio fotografava), ir várias vezes à loja de fotos e manipular
equipamento pesado e complexo. Uma trabalheira.
Selio, entre outras coisas, ainda fotografa eventos. Hoje, as
circunstâncias são diferentes. Duas máquinas digitais resolvem todas as
situações que surgem. Não há mais despesa com revelação de fotos que, muitas
vezes, encalhavam; consequentemente, não há deslocamento para ir a lojas;
acabaram-se os gastos com filmes e as fotos são mostradas aos interessados por
meio de laptops.
Selio, sortudo, ainda encontrou nesses anos preciosa e luxuosa
cooperação. Conheceu, namorou e casou com a bela Maria, companheira de todas as
horas.
A revolução no mundo da fotografia pegou muita gente boa de
surpresa.
“A Kodak foi a primeira empresa a criar a câmera digital, mas
naquela época, a maioria de seus lucros vinha da vendas de produtos químicos
utilizados nos filmes e eles tinham medo de investir em algo novo porque
achavam que podia prejudicar o seu negócio tradicional”, disse Olivier Laurent,
editor de notícias do British Journal of
Photography. “Quando eles perceberam, o mercado digital tinha chegado para
ficar, ultrapassado o filme e todos os concorrentes da Kodak tinham câmeras
digitais muito superiores. As câmeras Kodak nunca foram boas e a empresa perdeu
a reputação conquistada com o momento
Kodak”.
Em 1992, Don Strickland, ex-vice-presidente da Kodak, disse segundo
o The Guardian que a empresa estava
pronta para dar espaço em seu negócio para as câmeras digitais, mas que seus
chefes vetaram a ideia com medo de uma canibalização
do filme. E para além dos concorrentes e suas câmeras digitais e da entrada
tardia no mercado que ajudou a criar, a Kodak enfrentou nos últimos anos outro
obstáculo com o qual outras fabricantes também estão tendo que lidar: os smartphones como câmeras cada vez
melhores. Para Laurent, os telefones estão comendo o mercado de câmeras
compactas. “Por que ter uma câmera compacta quando uma de 8 megapixels no
iPhone é quase tão boa e ele está sempre lá no seu bolso?” Esse, como o próprio
mercado de câmeras já sabe, é um obstáculo a ser ultrapassado nos próximos anos
(http://tecnologia.terra.com.br/).
Tayssa Vandelli, jovem profissional da área, fala sobre máquinas
analógicas e digitais: “Não usei muito a analógica. Utilizei-a por um curto período
de tempo. Ela me ajudou a aprender a usar o modo manual mais rapidamente. Foi
uma vantagem, enquanto fazia o curso. A qualidade das fotos é bem legal e o
estilo “antigo” me agrada. A digital, obviamente, é mais rápida e você vê a
foto, imediatamente. Alguns fotógrafos ainda preferem a analógica. Ao compararem
fotos tiradas por duas máquinas, uma analógica e outra digital, com as mesmas
especificações, estes profissionais garantem que a foto da analógica tem melhor
qualidade”.
O fotógrafo do passado só conhecia a imagem que havia capturado
quando a revelação era feita. Há quem veja vantagem nisso. O fotógrafo dos dias
de hoje, certamente, não. Amadores e profissionais pragmáticos preferem o
presente. O produto final está imediatamente à disposição, o que permite,
também, a imediata correção de erros.
Os sobreviventes da era analógica (amadores, claro) se lembram de
prender filmes incorretamente dentro da máquina, fotografar o aniversário da
namorada e ter a desagradável surpresa, ao abrir a máquina para tirar o
registro da bela batendo palminhas e assoprando velinhas, de ver que nenhuma
foto havia sido tirada. Muitos romances acabaram por isso.
Luciana Almeida, 14 anos, atingida pela onda retro, usou a máquina
fotográfica do pai, uma anciã, mas muito bem conservada, Olympus Trip. Deve ter
embarcado em uma máquina do tempo para conseguir filme de 36 poses, mas,
máquina na mão, saiu por aí clicando. “Foi uma experiência estranha. Primeiro
porque só poderia tirar 36 fotos. Não sabia o que fotografar. É chato, também,
não saber ali, na hora, se a foto ficou boa. Fotografei um passeio da escola.
Sorte que meu celular tem uma câmera legal.”
A experiência da Luciana, segundo depoimento dela, foi válida, mas
não será repetida: “Foi estranho. As fotos ficaram tremidas, cortei cabeças. Só
três ficaram bacanas. Meu pai que levou pra revelar. Me zoou muito. E eu
fotografei no automático. Não uso aquela máquina nunca mais”.
Fotógrafos preciosistas garantem que a qualidade da imagem digital
não chega perto da conseguida com máquinas analógicas. A realidade, no entanto,
é que não há mais tanta diferença assim. Para 99% das pessoas que usam máquina
fotográfica não há diferença alguma. Essa discussão, aliás, já foi superada
pelas novas gerações. Brevemente, as fotos geradas por celulares superarão a
qualidade das obtidas por máquinas fotográficas. As compactas, pelo menos.
“Meu celular é só para telefonar”, diz a quase ludita Rita Alves, 50
anos. “Fotografo com uma Samsung digital. Uso transporte público por opção e,
infelizmente, no Rio, ainda é perigoso puxar um smartphone dentro do ônibus. Talvez, um dia, ainda fotografe com
celular, por enquanto, não”.
O Nokia PureView tem câmera poderosa em um celular. A mais poderosa,
no momento. Absurdos 41 megapixels que permitem qualidade para imprimir um outdoor, zoom de 3X e lentes Carl
Zeiss. O sistema operacional obsoleto e o alto preço (R$ 1.999,00) o mantém
longe do público, mas logo isso mudará.
Redes sociais de fotografia como o Instagram têm milhões de
associados usando IPhones e telemóveis com Android para exibir fotos amadoras
com efeitos cheios de boa intenção para outros milhões de amadores.
A fotografia artística é para poucos. A maioria simplesmente
paralisa momentos marcantes em imagens, sem preocupação de estar sendo original.
Cora Rónai, de O Globo, diz: “Fotografia,
na melhor acepção da palavra, é composição, enquadramento, deliberação.
Registros visuais variados podem até prescindir disso, mas não vão muito longe
como imagens”.
Fotos digitais são mais práticas, podem ser artísticas, criativas,
surpreendentes (dependerá, sempre, de quem usa a máquina), mas perdem-se com
relativa facilidade. Cabe um depoimento pessoal. Tenho fotos de família, em
papel, da década de 50 do século passado. Sessenta anos depois de tiradas estão
em perfeito estado, prontas para ser vistas. Nos últimos 20 anos saímos do
disquetão para o pendrive e passamos por vários sistemas operacionais. Como
armazenar as fotos digitalmente?
Uma amiga muito cuidadosa fotografa, guarda as fotos em um
computador, faz becape para outro, armazena na nuvem (em dois lugares
diferentes) e ainda imprime as melhores. É a única pessoa que conheço que faz
isso.
Não voltaremos à máquina fotográfica analógica. Os fotógrafos
amadores de agora continuarão na dúvida entre a compacta e o celular. Certeza,
só uma: continuaremos fotografando. É maravilhoso – sempre foi – armazenar
lembranças e, de vez em quando, revê-las.