sexta-feira, fevereiro 22, 2013

FILÓ



- Filó, chega mais. Sentaí, cara. Uma cerva?
- Cai bem. Maçarico ligado, sacumé.
- Vi sua mulher, ontem, no BBB. Os pessoal tá dizendo que ela tá bem. Dois meses, né.
- Já passou por três paredões.
- Ontem ela se acabou com aquele saradão. Embaixo do edredom pegou fogo.
- Bié, me chamou aqui pra me sacanear? Vou nessa.
- Qualé, Filó, tá todo mundo vendo. É o corno, em rede nacional. O Jair pôs até peiperviu no boteco dele. A cambulhada fica por lá até a madruga.
- Ele é um bundão. Quis chegar na Jurema e ela não deu a menor condição. É despeito. E a turma daqui é muito provinciana.
- Mas, Filó, essa porra não te incomoda?
- A Jurema me falou que um olheiro tinha convidado ela pro programa; me disse que era a chance da vida dela; ela sempre quis ser atriz; estudou no curso do Wolf Maia.
- Até aí tudo bem, Filó, mas ir pra baixo das cobertas com o saradão.
- Ela me disse que precisaria de estratégia para ficar o máximo de tempo no programa e até ganhar, se desse. Formar casal é boa tática. Mas tem de passar verdade, se não o Brasil desaprova. Ela está jogando.
- Sei lá, acho que não gostaria de ver minha mulher sendo encoxada por um saradão, embaixo do edredom. Eu só, não, O Brasil todo.
- Bié, o que você viu? Dois corpos se movimentando embaixo das cobertas. Tudo representação. Estratégia.
- Movimentação e gemidos. Como geme a Jurema.
- Encenação.
- E os beijos de língua na festa?
- Beijo técnico. Não são de língua. Ela fez curso, põe a língua na garganta.
- A dele, né?
- Bié...
- Filó, você...
- Bié, logo na primeira semana a Jurema levou um carro. Faturou 10 mil na prova da bomba. Ganhou viagem com acompanhante para Cancun. Tem chances de faturar um milhão e meio e a Playboy já conversou comigo.
- Filó, você...
- Bié, a Jurema sempre foi assediadíssima. Olha pra mim, você acha que mereço aquela mulher? Por um milagre, ela olhou pra mim, ficou comigo, diz que me ama, é carinhosíssima... Bié, numa situação dessa você olha proutro lado.
- Filó...
- Bié, vamos tomar a cerva e falar do nosso Fluminense. O Fred ontem não jogou nada.

domingo, fevereiro 17, 2013

SEM DEFINIÇÃO




- Raul, querido, sua panturrilha está fantástica. Proporções ótimas, carnatura densa, musculosa, ao mesmo tempo delicada. Delicada e viril.
- Dudica, estou com o Tarlis Bars como personal. Esta panturrilha é obra dele.
- O Bars é uma fortuna.
- Ele tem uma quedinha por mim. Me examinou e me encaixou 15 dias depois na agenda dele.
- Que raiva!!!
- Ele foi duro comigo. “Raul, que assimetria é essa? Panturrilha sem densidade, esmaecida; coxa sem definição; abdômen com gomos sem paralelismo acentuado. E o seu tórax? Meu alfajor, o que dizia Don Taylor sobre a relação tórax/abdômen? Mas, vou dar um jeito. Em nome de nosso passado.”
- Trabalho de alguns meses, Raulzinho. Não malho aqui há uns três meses.
- Notei.
- O quê? Viajei, fiquei uns tempos fora. O Johnny precisou dar uma parada estratégica e fomos dar um giro pela Ásia. Mas não estou gorda.
- Não disse isso.
- Seu olhar.
- Você está grande.
- Não estou gorda. Meu problema é a falta de definição. Minha barriga está chapada. Perna sem celulite. Tá vendo? E a bunda, e a bunda? Olha bem. Durinha. Aperta, porra. Só preciso definir.
- Em dois meses fica legal, Dudica.
- Tudo culpa do Johnny. Inventou da gente circular só por países escrotos. Afeganistão, Bangladesh, Iêmen, Irã, Butão, Nepal, interior da China e outras merdas. “Quando estivermos com os amigos vamos falar de lugares em que eles nunca foram. Vão querer morrer.” Quem quer falar que foi ao Iêmen? Agora, tô sem definição.
- Quer o Bars emprestado este mês?
- Só se você pedir a ele pra não ser mau comigo. Peça pra ele não dizer que estou gorda.
- Pode deixar. Você está sem definição, mas vai ficar ótima. Se não acredita, olhe minha panturrilha.

sábado, fevereiro 09, 2013

MATADOR INVISÍVEL



75 anos, corpo seco, lacônico. Profissão: matador.
Há menos de 10 anos na atividade, reputação ótima, no entanto. O nome profissional, Bill, dava a falsa impressão de ser ele nordestino. Errado.
Carioca, Bill, nome de batismo André, tinha agenda cheia. Começou por acaso. Conversava com um amigo, reclamava da merreca que recebia de aposentadoria. O amigo perguntou de chofre se ele mataria pessoas por dinheiro. André respondeu prontamente que sim, mataria. O amigo lhe disse que tinha uma parada para ele.
No dia seguinte, Jofre, um marginal da área, o entrevistou: “Sou intermediário. O homem não aparece. Cada serviço vale mil pratas. Você vai ficar com um segmento tranquilo. Seus clientes serão pessoas mais humildes. A mulher está de saco cheio do marido, ou vice-versa, contrata, você detona. Ex-namorado ciumento, marido corno, empregado aporrinhado com o chefe... Essas coisas. Só gente fodida. Tem de ser serviço limpo e, se der merda, você segura a bronca. A gente vai atrás da família, se vacilar.”
André não tinha família, achou desnecessário revelar. Em casa, pensou na proposta já aceita. Vivera dentro da lei, pagou impostos, tomou decisões aos olhos de todos corretas. Estudou, trabalhou, formou família. Teve filhos. Um morreu aos 20, acidente de carro. A filha casou-se e foi morar na Alemanha. Conversava com ela, por telefone, uma vez por ano. A mulher o deixou, foi viver com outro e morreu quando ele completou 60 anos. Visitou-a no hospital e ouviu-a dizer que os últimos cinco anos com Inácio foram os melhores da vida dela. Desculpou-se, lhe disse que nada tinha contra ele, fora bom marido, mas era estranho.
Voltou a morar no subúrbio de sua adolescência, desfez-se da casa e foi morar de aluguel. Entendeu que não viveria muito tempo. O dinheiro da casa seria para viver o que lhe restava do caminho.
Cinco anos de tédio. A oferta de trabalho. A primeira morte. Nenhuma emoção. Era estranho, mesmo. A mulher estava certa.
Gostava do que fazia não por sentir prazer em matar, mas por sentir que como matador era muito bom. Jofre lhe disse muitas vezes, nos últimos dez anos, que o homem estava satisfeitíssimo com seu trabalho, cogitava até subi-lo de patamar. Quem sabe umas encomendas de gente da classe média?
Estava satisfeito operando na faixa em que atuava. Entregava um, dois pacotes por mês. Incrementava a aposentadoria, tomava a cervejinha diária de fim de tarde com os amigos, jogava o buraquinho e pensava na vida.
O amigo que lhe inserira no esquema uma vez perguntou se pensava em parar. André olhou-o, ficou um tempo em silêncio e “Não, não pretendo. Quer dizer, tenho 75 anos, logo terei de parar, por enquanto, continuo”. O amigo: “Você não fica tenso, não sente remorso?”
André não era ligado a atividades culturais. Lazer: ver filmes de faroeste e policiais. O primeiro serviço, fez de forma esbaforida, em uma rua escura. O homem caiu, ele fugiu apressadamente, nenhuma culpa, mas estabanado.
Em Os imperdoáveis, o velho pistoleiro entra no salão, diversos homens atiram contra ele. Lentamente, o matador aponta sua arma, faz mira e mata um a um seus oponentes, calmamente.
Seu último serviço, uma mulher, Bill realizou dentro de um posto de saúde. Entrou, atirou à queima-roupa, saiu. Ao barulho do tiro todos correram. Ninguém o viu entrar nem sair. Era velho, pobre, em um bairro classe D estagnada. Era invisível.
Um derrame tirou André de circulação. Aos 78, estava inteiro de novo. Quis voltar. Jofre o dissuadiu. “Você prestou serviços preciosos. O homem gosta de você. Todo mês vai pingar 1 conto em sua conta. Quer que você treine alguém.”
André aceitou, convidou o Pereira, ancião franzino, cara de vovô bondoso. Jofre duvidou da escolha. André lhe disse: “Ele sabe atirar, vive sozinho, não tem o que fazer. Está só esperando a morte. É invisível como eu e gosta de matar. Não haverá melhor”.

sexta-feira, fevereiro 01, 2013

A FESTA DO RIO



Passei os carnavais de minha adolescência em Macaé. Década de 60, século passado.
Um casal de primos, João Pinto e Elmira, cinco filhas e um filho me hospedavam do começo de janeiro até depois do carnaval, não importando os dias reservados para a folia de Momo.
Era um bom tempo e eu tinha contato com um aspecto romântico do carnaval. Ia aos bailes carnavalescos infantis do Fluminense macaense. A família toda se divertindo, dançando ao som das marchinhas. Voltávamos pela Rua Direita, encontrávamos amigos e, fantasiados, brincávamos uns com os outros.
Minha prima, cozinheira conceituada na cidade (nada a ver com os chefs de hoje que harmonizam espuma de abacate com nuvem de javali), funcionária do Grupo Escolar, transformava-se, literalmente, em um palhaço e saía com um grupo de 50 outros palhaços pelas ruas da cidade visitando lares e se esbaldando pelos logradouros da Princesinha do Atlântico.
Hoje em dia não sou mais chegado a carnaval. Houve uma época que deixei de apreciar o carnaval por motivos religiosos. Converti-me aos 20 anos. Acreditei em tolices que me foram ensinadas. Amadureci e não é mais essa a religião que me afasta da folia.
Pouca coisa associada ao carnaval me atrai. É uma festa de excessos. Muita gente aglomerada me afasta. E há a perversidade de nossos dias que cresce no carnaval.
As filhas de meus primos saíam à noite para o baile no mesmo Fluminense que eu frequentava à tarde. Lá pelas dez iam as cinco mais outras tantas moças da rua para o baile. Eu dormia na sala e via chegar uma a uma. A que enjoasse da festa vinha embora, sem correr risco algum. Um macaense ao ler este texto saberá que nos dias de hoje as coisas são diferentes.
Eram diferentes do que eu via, também. Um menino de 12 anos não percebe a atmosfera malévola que o cerca. Os daquela época, pelo menos, não percebiam.
Muito por causa desse momento de minha vida, jamais vi no carnaval a festa que assombra, ainda hoje, muitos evangélicos. Ninguém faz em quatro dias o que não faria nos outros 361.
Há uns dez anos, entrei no Metrô com a esposa e fui para Copacabana e Ipanema. A ideia era ver o movimento carnavalesco de rua e tomar um sorvete na Chaika, em Ipanema. Vimos pessoas fantasiadas caminhando de um lado para o outro, blocos minúsculos, muita gente rindo. Foi um dia tão bom que Rosangela e eu jamais o repetimos. Não me agradaria encontrar blocos de foliões que arrastam multidões de mijões pelas ruas. Não lido bem com bêbados (deficiência minha, reconheço). Prefiro, por isso, ficar em casa.
Na década de 90, participei, profissionalmente, do Impacto Carnaval da Convenção Batista Carioca. Fui a contragosto. A ideia de evangelizar foliões, em pleno Centro do Rio, de madrugada, não me era agradável. Arrastei Rosangela comigo e surpreendemo-nos. Há muita gente desesperada, fantasiada, com sorriso estampado no rosto. O desespero se manifesta depois de uma conversa de alguns minutos com um voluntário do Impacto. Foi uma experiência muito boa e reveladora.
Não sou dono da verdade, por isso não simplifico associando carnaval às forças satânicas, mas a inocência que tinha foi embora há décadas. O carnaval rende muito dinheiro, logo, os meios mais escabrosos são usados para fazê-lo atrair gente fraca, pronta a fazer lambança à menor oportunidade.
No passado, crentes encerravam-se em retiros espirituais no carnaval. Eu gostava muito. Algumas igrejas, atualmente, até desfilam na avenida em bizarras escolas de samba evangelísticas. (Deem um desconto para minha estranheza. Sou velho.)
Não direi o que você deve fazer no carnaval. Não é meu papel. De minha parte, ficarei em casa, darei uma saidinha para ver um bom filme e, se minha coluna permitir, quem sabe não dou umas voltas por Copacabana e Ipanema. Pena que a Chaika fechou.

FOTOGRAFIA – arte, profissão e prazer



Fotografar já foi mais trabalhoso para amadores e profissionais. Amadores tinham à disposição máquinas com poucos recursos, lente fixa, flash de pouca potência e espaço reduzido para manobras artísticas. Profissionais possuíam máquinas poderosas, lentes intercambiáveis, flashes poderosos e recursos técnicos que lhes permitiam fazer imagens primorosas. Precisavam, também, de um caminhão para transportar o material de trabalho.
No presente artigo, interessa-nos, principalmente, o fotógrafo amador. Não é o caso de Selio Moraes, um profissional respeitado, que será usado como ilustração do notável progresso da fotografia nos últimos anos.
Selio fotografava eventos de um grupo religioso que se espalhava pelo Brasil. Viajava de Norte a Sul do país para desenvolver seu trabalho. Carregava o próprio equipamento no braço, que constava de dezenas de rolos de filmes, máquinas fotográficas, flashes, lentes etc. Precisava contar com a sorte de encontrar, na cidade onde se realizaria o evento, uma boa loja de revelação de fotos que fizesse serviço de qualidade e trabalhasse com rapidez.
Nos eventos Selio precisava “maximizar” seus rendimentos. O contratante lhe pagava, mas uma fonte de renda complementar vinha dos participantes que gostavam de comprar fotos em que apareciam e cenas marcantes do evento. Essas reuniões duravam de dois dias a uma semana. Selio, dedo nervoso, fazia centenas de fotos, que depois de reveladas eram expostas para venda. Precisava contratar auxiliares (as fotos eram fixadas em paredes, à disposição dos clientes, e havia a necessidade de gente para vendê-las, enquanto Selio fotografava), ir várias vezes à loja de fotos e manipular equipamento pesado e complexo. Uma trabalheira.
Selio, entre outras coisas, ainda fotografa eventos. Hoje, as circunstâncias são diferentes. Duas máquinas digitais resolvem todas as situações que surgem. Não há mais despesa com revelação de fotos que, muitas vezes, encalhavam; consequentemente, não há deslocamento para ir a lojas; acabaram-se os gastos com filmes e as fotos são mostradas aos interessados por meio de laptops.
Selio, sortudo, ainda encontrou nesses anos preciosa e luxuosa cooperação. Conheceu, namorou e casou com a bela Maria, companheira de todas as horas.
A revolução no mundo da fotografia pegou muita gente boa de surpresa.
“A Kodak foi a primeira empresa a criar a câmera digital, mas naquela época, a maioria de seus lucros vinha da vendas de produtos químicos utilizados nos filmes e eles tinham medo de investir em algo novo porque achavam que podia prejudicar o seu negócio tradicional”, disse Olivier Laurent, editor de notícias do British Journal of Photography. “Quando eles perceberam, o mercado digital tinha chegado para ficar, ultrapassado o filme e todos os concorrentes da Kodak tinham câmeras digitais muito superiores. As câmeras Kodak nunca foram boas e a empresa perdeu a reputação conquistada com o momento Kodak”.
Em 1992, Don Strickland, ex-vice-presidente da Kodak, disse segundo o The Guardian que a empresa estava pronta para dar espaço em seu negócio para as câmeras digitais, mas que seus chefes vetaram a ideia com medo de uma canibalização do filme. E para além dos concorrentes e suas câmeras digitais e da entrada tardia no mercado que ajudou a criar, a Kodak enfrentou nos últimos anos outro obstáculo com o qual outras fabricantes também estão tendo que lidar: os smartphones como câmeras cada vez melhores. Para Laurent, os telefones estão comendo o mercado de câmeras compactas. “Por que ter uma câmera compacta quando uma de 8 megapixels no iPhone é quase tão boa e ele está sempre lá no seu bolso?” Esse, como o próprio mercado de câmeras já sabe, é um obstáculo a ser ultrapassado nos próximos anos (http://tecnologia.terra.com.br/).
Tayssa Vandelli, jovem profissional da área, fala sobre máquinas analógicas e digitais: “Não usei muito a analógica. Utilizei-a por um curto período de tempo. Ela me ajudou a aprender a usar o modo manual mais rapidamente. Foi uma vantagem, enquanto fazia o curso. A qualidade das fotos é bem legal e o estilo “antigo” me agrada. A digital, obviamente, é mais rápida e você vê a foto, imediatamente. Alguns fotógrafos ainda preferem a analógica. Ao compararem fotos tiradas por duas máquinas, uma analógica e outra digital, com as mesmas especificações, estes profissionais garantem que a foto da analógica tem melhor qualidade”.
O fotógrafo do passado só conhecia a imagem que havia capturado quando a revelação era feita. Há quem veja vantagem nisso. O fotógrafo dos dias de hoje, certamente, não. Amadores e profissionais pragmáticos preferem o presente. O produto final está imediatamente à disposição, o que permite, também, a imediata correção de erros.
Os sobreviventes da era analógica (amadores, claro) se lembram de prender filmes incorretamente dentro da máquina, fotografar o aniversário da namorada e ter a desagradável surpresa, ao abrir a máquina para tirar o registro da bela batendo palminhas e assoprando velinhas, de ver que nenhuma foto havia sido tirada. Muitos romances acabaram por isso.
Luciana Almeida, 14 anos, atingida pela onda retro, usou a máquina fotográfica do pai, uma anciã, mas muito bem conservada, Olympus Trip. Deve ter embarcado em uma máquina do tempo para conseguir filme de 36 poses, mas, máquina na mão, saiu por aí clicando. “Foi uma experiência estranha. Primeiro porque só poderia tirar 36 fotos. Não sabia o que fotografar. É chato, também, não saber ali, na hora, se a foto ficou boa. Fotografei um passeio da escola. Sorte que meu celular tem uma câmera legal.”
A experiência da Luciana, segundo depoimento dela, foi válida, mas não será repetida: “Foi estranho. As fotos ficaram tremidas, cortei cabeças. Só três ficaram bacanas. Meu pai que levou pra revelar. Me zoou muito. E eu fotografei no automático. Não uso aquela máquina nunca mais”.
Fotógrafos preciosistas garantem que a qualidade da imagem digital não chega perto da conseguida com máquinas analógicas. A realidade, no entanto, é que não há mais tanta diferença assim. Para 99% das pessoas que usam máquina fotográfica não há diferença alguma. Essa discussão, aliás, já foi superada pelas novas gerações. Brevemente, as fotos geradas por celulares superarão a qualidade das obtidas por máquinas fotográficas. As compactas, pelo menos.
“Meu celular é só para telefonar”, diz a quase ludita Rita Alves, 50 anos. “Fotografo com uma Samsung digital. Uso transporte público por opção e, infelizmente, no Rio, ainda é perigoso puxar um smartphone dentro do ônibus. Talvez, um dia, ainda fotografe com celular, por enquanto, não”.
O Nokia PureView tem câmera poderosa em um celular. A mais poderosa, no momento. Absurdos 41 megapixels que permitem qualidade para imprimir um outdoor, zoom de 3X e lentes Carl Zeiss. O sistema operacional obsoleto e o alto preço (R$ 1.999,00) o mantém longe do público, mas logo isso mudará.
Redes sociais de fotografia como o Instagram têm milhões de associados usando IPhones e telemóveis com Android para exibir fotos amadoras com efeitos cheios de boa intenção para outros milhões de amadores.
A fotografia artística é para poucos. A maioria simplesmente paralisa momentos marcantes em imagens, sem preocupação de estar sendo original. Cora Rónai, de O Globo, diz: “Fotografia, na melhor acepção da palavra, é composição, enquadramento, deliberação. Registros visuais variados podem até prescindir disso, mas não vão muito longe como imagens”.
Fotos digitais são mais práticas, podem ser artísticas, criativas, surpreendentes (dependerá, sempre, de quem usa a máquina), mas perdem-se com relativa facilidade. Cabe um depoimento pessoal. Tenho fotos de família, em papel, da década de 50 do século passado. Sessenta anos depois de tiradas estão em perfeito estado, prontas para ser vistas. Nos últimos 20 anos saímos do disquetão para o pendrive e passamos por vários sistemas operacionais. Como armazenar as fotos digitalmente?
Uma amiga muito cuidadosa fotografa, guarda as fotos em um computador, faz becape para outro, armazena na nuvem (em dois lugares diferentes) e ainda imprime as melhores. É a única pessoa que conheço que faz isso.
Não voltaremos à máquina fotográfica analógica. Os fotógrafos amadores de agora continuarão na dúvida entre a compacta e o celular. Certeza, só uma: continuaremos fotografando. É maravilhoso – sempre foi – armazenar lembranças e, de vez em quando, revê-las.