quarta-feira, abril 26, 2006

O subalterno

O chefe estava feliz.
– Saímos do vermelho este mês. Vai dar pra repassar alguma coisa pros funcionários.
O subalterno protesta:
– Mas, doutor, estamos saindo do sufoco agora. Não seria melhor consolidarmos esta situação antes de falarmos em aumento.
O chefe, rindo.
– Quem falou em aumento? Pensei em um bônus. Esses meses todos o pessoal tem se sacrificado. Atrasamos o salário algumas vezes. Cortamos plano de saúde. Não damos mais vale para refeição. A turma, mesmo assim, não deixou a peteca cair.
O subalterno insiste:
– Doutor, seu coração é muito grande. A turma deveria agradecer por ter um emprego. Se o senhor der bônus este mês, no próximo vão querer de novo.
O chefe, apreensivo.
– Talvez você tenha razão, Figueira. Creio que ia me precipitar.
O subalterno sugere:
– Acho melhor nem pagarmos amanhã. Vamos deixar pra semana que vem. Eu reúno o pessoal e digo pra ficarem tranqüilos porque estamos correndo atrás do salário do mês.
O chefe, pensativo.
– Tá certo, Figueira. Faça isso. Comunique os funcionários.
O subalterno exulta:
– Vou fazer um comunicado escrito, doutor. É mais profissional.
O chefe, cansado.
– Figueira, todo patrão precisa de um auxiliar como você. Insensível, perverso, cínico, bajulador, um verme.
O subalterno babeja:
– Muito obrigado, doutor, faço o meu melhor.

Chega de política

Eventualmente, fiz comentários políticos nesse espaço. Isso acabou.
Não tenho mais colhões para ler/ver/ouvir política.
Meu tempo precioso não gastarei nem considerando alguém para votar como síndico de meu condomínio.
Quer saber de política? Suma daqui.

Coisa bonita de se ver - Anna Kournikova

O tempo

Pat estava jurada de morte.
Namorou um soldado.
Ele subiu na carreira, virou gerente e quis ser dono de Pat.
Pat gostava do cara, mas propriedade dele não seria.
Terminou, saiu da comunidade, da cidade. O amor do general era doido.
Levou a mãe com ela, porque mais nada tinha pra levar.
Dez anos é muito tempo.
Voltou ao Rio. Um absurdo não poder vir à cidade.
Passou uma semana em casa de primos.
Ligou para amigas. Falou das saudades.
Perguntou do antigo namorado.
Ninguém sabia.
Há anos foi escorraçado da favela. Deve estar morto.
Não estava.
Três tiros e Pat morreu.
Antes de morrer, talvez tenha pensado: “Dez anos não é tanto tempo assim”.

terça-feira, abril 11, 2006

Releitura 1

Intencionalidade
Meu mozinho avisou:
– Tá ridículo, tênis e camiseta vermelha. Se enxerga, põe uma roupa mais sóbria.
– Sóbrio, eu... Qualé?
Os dois afro-brasileirinhos parece que também não gostaram do vermelho.
– Ô tio, o pessoal do 3º Comando não gosta de vermelho.
– E eu com isso? Tô cagando pro exército. A ditadura já acabou há muito tempo. Comunismo, vermelho, isso já foi.
– Tio, cê é folgado. A turma do 3º vai te tirar essa camisa pelo rabo.
– Não há mais espaço pro arbítrio. Sou cidadão em uma democracia. Vou onde quero, do jeito que quero. Os militares que cumpram suas obrigações.
Os moleques desistiram de mim, mas outros três baitolões que estavam perto, não. Me encheram de porrada e ameaçaram:
– Da próxima vez que aparecer de vermelho por aqui, morre.
Meu mozinho fazia os curativos e ouvia minhas lamúrias:
– Tudo secreta. Nenhum deles estava de uniforme. Tão caçando comunistas de novo.

sexta-feira, abril 07, 2006

A cura da insônia

A insônia é um mal global.
Cientistas buscam meios de acabar com ela. Encontram, no máximo, paliativos.
Milhões de pessoas gostariam de deitar-se para dormir... e dormir.
A cura da insônia, no entanto, está bem mais próxima do que se imaginava.
Elienai Castilho, médico pediatra, escreveu artigo para a prestigiosa revista Medicina Hoje, em que apresenta tese que vem sendo considerada revolucionária no meio acadêmico. O dr. Averald Ornnius, diretor da Clínica Morfeu, garante que a teoria de Castilho mudará todo o tratamento das doenças do sono.
“Sempre viajo de metrô e observo há muito tempo que nenhum passageiro ao se sentar nos bancos de cor laranja, destinados a idosos, gestantes e deficientes físicos, consegue ficar acordado. Há nesses bancos alguma substância, talvez mesmo a cor, que faz com que as pessoas quedem em sono profundo. Uma vez vi uma senhora idosa gritando no ouvido de um rapaz, pedindo que ele lhe cedesse o lugar. O rapaz, coitado, não conseguiu acordar, tão profundo era o sono em que estava. Creio, por isso, ser essa a solução para a insônia, pelo menos para uma parte do público interessado. Tenho observado que gestantes, idosos e deficientes físicos não dormem com tanta facilidade ao contato do banco de cor laranja. Mas descobrir a razão por que isso acontece é trabalho para pesquisadores mais gabaritados do que eu. Estamos muito perto da cura da insônia”, declarou o dr. Castilho