O mercado, esse espertalhão que vive do nosso
sangue, há muito tempo descobriu o adolescente. No passado, a adolescência
começava aos 12 anos e encerrava-se com pompa aos 18. Hoje, a faixa etária
estendeu-se. Começa aos 10 anos e algumas vezes se encerra aos 25. Há
especialistas que só consideram terminada a adolescência quando o rapaz ou a
moça saem da casa dos pais e se sustentam.
O mercado fatiou essa faixa etária e nos EUA os tweens (10 a 13 anos) têm altíssimo
poder de fogo. Desde petizes os tweens compram
suas próprias roupas, leem livros que lhes interessam, consomem ídolos
fabricados para eles e fazem barulho. Depois dos 13 são teens (lá e cá, muito pela paixão que nutrimos pelo idioma de
Justin Bieber).
“A adolescência é uma etapa intermediária do
desenvolvimento humano, entre a infância e a fase adulta. Este período é
marcado por diversas transformações corporais, hormonais e até mesmo
comportamentais. Não se pode definir com exatidão o início e o fim da
adolescência (ela varia de pessoa para pessoa), porém, na maioria dos
indivíduos, ela ocorre entre os 10 e 20 anos de idade (período definido pela
OMS – Organização Mundial da Saúde)” – http://www.suapesquisa.com.
Neste texto, quando falarmos de adolescentes,
pensaremos em jovens de 13 a 18 anos (só para facilitar minha vida). Os termos tweens e teens não serão mais mencionados aqui. Fiquemos com os nossos
pré-adolescente e adolescente.
O adolescente é fascinante. Um grupo poderoso,
certamente. Na adolescência formamos os laços mais fortes. Em qualquer época da
vida fazemos amizades, mas na adolescência cremos que essa ligação será para
toda a vida.
Há adolescentes problemáticos (como há jovens,
adultos e idosos). Não se falará deles neste texto, que é descaradamente uma
apologia do vigor, entusiasmo e arrogância adolescente.
BARRA PESADA
Na adolescência formamos nossos grupos de
amizade, definimos a carreira que seguiremos, corremos atrás de emprego e
enlouquecemos com o sexo oposto. Tudo isso com hormônios explodindo dentro de
nós. Nós, porque eu também passei por isso e sei que a barra pesa.
Estudei com uma menina desde o primário (agora,
acho que é 1º Grau ou Ensino Fundamental) até o pré-vestibular. Aluna
aplicadíssima, orgulho do papai e da mamãe, Sônia apaixonou-se por um malandro
de nossa turma. Uma simpatia de garoto, mas vagabundo. Sônia não passou no
Vestibular, concluiu precariamente o Ensino Médio e ainda engravidou.
Engravidou em uma época que estigmatizava a mãe solteira terrivelmente. Retomei
contato com ela, via Facebook, e ouvi em uma longa conversa as dificuldades que
enfrentou: “Meus pais me apoiaram, mas só pude voltar a estudar 10 anos depois
de meu filho nascer. Papai fez questão que eu criasse meu filho e só depois que
ele faleceu é que minha mãe resolveu ficar com o menino para eu estudar. Hoje,
tenho três filhos, todos casados. Estou viúva e mamãe vive comigo. Tem quase
100 anos”.
O adolescente está sempre a uma distância mínima
do erro. E é fácil vacilar quando são tantas as oportunidades para fazermos
lambança.
Devemos considerar que o adolescente com boa
estrutura familiar tem mais chances de seguir caminho seguro. O deslumbramento
derruba muitos garotos e garotas. E não são vítimas de deslumbramento só os
jovens milionários do futebol.
A barra é pesada para o adolescente, mas ele
sempre acha que dá para consertar as bobagens feitas. Às vezes, não dá. O
sentimento de onipotência que acomete a garotada pode levá-la ao fundo do poço,
mas, se bem trabalhado, esse sentimento pode ser transformado em confiança em
si mesmo sem o exagero de se achar infalível.
ARROGÂNCIA
Arrogância é altivez, insolência, orgulho,
presunção. É desagradável lidar com pessoas arrogantes. Eu me mantenho longe
delas. O adolescente tem muita arrogância arraigada nele. Ele pode. Ele tem
muito tempo pela frente. Ele e ela são desejados, cobiçados. Ele e ela terão
muito dinheiro, poder. No meu entendimento, não chega a ser errado pensar
assim. O certo, no entanto, é que toda essa presunção geralmente não leva a
lugar algum.
As igrejas batistas se dividem em faixas etárias
como estratégia para o treinamento de seus membros. Adolescentes carregam
pedras. Fazem o que ninguém faz. Já irritei adolescentes, involuntariamente,
quando eles vinham me apresentar uma ideia para melhorar uma atividade e eu
dizia: “Sua ideia é boa, mas isso já foi feito e não deu certo”. Ouvi, como
resposta, algumas vezes: “Não deu antes, pode dar agora”. Um dia ouvi, de
verdade, e o projeto fracassado do passado “bombou” no presente. Aprendi. Trabalhar
com adolescentes não é fácil, mas compensa, e muito.
Se a arrogância do adolescente se transforma em
confiança genuína e ele consegue compreender que deve prestar atenção no que
lhe está sendo dito e admitir que também erra de vez em quando, temos alguém
precioso ao nosso lado. E ele, certamente, não precisa concordar submissamente
com tudo o que vem da liderança.
VIGOR
Um texto na barra do segundo caderno de O Globo
me chamou a atenção. Uma senhora, aos 70 anos, resolveu compor músicas no seu
teclado Cassio. Em pouco tempo transformou-se em uma estrela da música
islandesa (de lá saíram Sugarcubes, Bjork, Seabear). Em oito anos, Sigridur
Nielsdóttir compôs 600 músicas. Não me interessa aqui a qualidade da obra de
Sigridur. Importa a disposição, o vigor da velha senhora. É este vigor que o
adolescente tem. Vigor/coragem de fazer o que os mais velhos temem empreender.
Nada mais patético do que adolescente desanimado, conformado, sem entusiasmo.
Minha amada, na adolescência, ia para a igreja a
pé. Inhaúma–Praça Seca, uns 10km. Do Campinho até a Praça, distribuía folhetos
evangelísticos no lado direito da Cândido Benício. Na volta, da Praça até o
Campinho, cobria o lado esquerdo. Pregava em ar livre, cantava no coral, fazia
evangelismo em presídio... (era vigorosa e meio doida). Hoje, só de lembrar dessa época ela fica cansada. O
adolescente tem essa disposição, o vigor físico, a vontade de transmitir aquilo
em que ele acredita.
ENTUSIASMO
“Excitação da alma quando admira excessivamente”.
Gosto dessa definição de entusiasmo tirada do Dicionário Michaellis. Também
gosto de arrebatamento como sinônimo de entusiasmo. O adolescente é arrebatado,
exagerado, apaixonado (uma boa parte deles, pelo menos) e, se acredita em uma
causa, se atira de peito aberto.
Quem lida com adolescente na vida secular ou
dentro de igreja sabe que precisa conquistá-lo. Um mesmo grupo de adolescente
rende muito com um líder e não rende nada com outro. O adolescente, pela
imaturidade, é muito dono da verdade; adora pegar quem o lidera em contradição;
se regozija em arrancar máscaras. Depois de um tempo, e muitas tentativas, se
não consegue, ele respeita quem o está capitaneando. E do respeito ao capitão
passa ao entusiasmo à causa que o capitão defende. Já vi turmas que detestavam
matemática passarem a amá-la depois de receberem aulas de verdadeiros mestres.
Também já vi grupos debruçarem-se sobre a Bíblia inspirados por mestres que
além de conhecer viviam as verdades das Escrituras.
Um grande erro, sempre em minha opinião, de
adultos que trabalham com adolescentes é se comportarem como se fossem
adolescentes. Não são, e eles percebem a impostura.
O Fluminense, no passado, tinha um ponta-direita
velocíssimo: Cafuringa. Fez um ou dois gols em toda a carreira. Seu problema:
era tão veloz que na maioria das vezes saía pela linha de fundo com bola e
tudo. Não sabia dosar a energia que tinha. Deu azar de não ter encontrado um
técnico que o instruísse.
O adolescente tem pouca noção de que vive uma
fase privilegiada da vida. Pode escolher e seguir o rumo que desejar. Sei que
de muitos adolescentes foi roubada esta oportunidade, mas muitos que a têm
deixam-na passar. O adolescente é responsável por sua história. Deve usar este
vigor, entusiasmo e destemor para conseguir o melhor para si e para os seus.