sábado, janeiro 30, 2010

SOLUÇÃO FINAL



Fanático por histórias em quadrinhos, Sebastião Silva resolveu criar um alterego: o Solução Final.
Precisava definir o uniforme, desenvolver habilidades e estabelecer os alvos de sua cruzada anticrime.
Sua inspiração era The Punisher, de Garth Ennis. Sebastião não tinha superpoderes, o Justiceiro também não. O herói carniceiro desenvolveu talento para matar e só o fazia em nome de um senso de justiça torto, mas muito popular. Quem não quis justiçar um criminoso qualquer, pelo menos nas grutas da mente? Era com isso que Sebastião contava para que Solução Final se tornasse um justiceiro popular.
Sebastião era homem de 1,85m, forte, zeloso com o corpo. Praticava jiu-jitsu há muitos anos e angariou prestígio como lutador de caratê. Reconhecia que com armas de fogo não era muito bom, mas sempre podia melhorar.
O uniforme, então, em homenagem à sua inspiração, seria preto. A figura no peito, uma onça estilizada. Boca aberta, as presas arreganhadas. Consultaria alguém do ramo para ajudá-lo.
Seus alvos seriam os corruptos. Não se preocuparia com assassinos, estupradores, ladrões comuns. Só combateria corruptos. A primeira ideia que lhe veio à mente foi usar como assinatura a decapitação dos corruptos justiçados. Depois pensou e achou que seria exagerado. Talvez pescoços quebrados fossem bons como marca de que aquele corrupto fora morto por ele e com a vantagem de poder usar seus conhecimentos de artes marciais.
Uniforme, habilidades e alvo estavam definidos.
Outra coisa que emprestaria de o Justiceiro seria o veículo para se deslocar: uma van. Claro que com película nas janelas. O povo estranharia um homem fantasiado dirigindo pela cidade. Bem, talvez não, mas para que arriscar?
Todo herói tem um amigo que sabe tudo sobre ele. Mais do que saber, o ajuda em sua missão. Esse auxiliar, normalmente, é exímio conhecedor de computadores e invade máquinas alheias para ajudar o herói. Sebastião nem amigos tinha. Entre os conhecidos, nenhum preenchia os requisitos que julgava fundamentais para ser um bom ajudante de herói. Pensaria nisso mais para frente.
A mulher não poderia saber de nada. Ela já implicava de ele gastar tempo lendo quadrinhos. “Sebastião, você é mecânico. Procure ser um excelente mecânico. Estude, em vez de perder tempo lendo gibis e lutando com marmanjos”, era o nhenhenhém constante dela. Se não fossem os filhos... A mulher não compreendia que ele era um predestinado. Veio ao planeta com uma missão. Não sabia qual era até bem pouco tempo. Agora, sabia: matar corruptos.
Seria, no início, um herói solitário. Com alguma fama, depois de eliminar três ou quatro, quem sabe não despertaria em alguém o desejo de participar da nobre pugna.
Adorava esta palavra: pugna. Aliás, o primeiro nome que pensou em adotar foi Pugnador. Aí, matutou, ninguém vai saber o que quer dizer. De repente, surgiu em sua mente o Solução Final. Nem sabia se existia algum herói ou mesmo vilão com esse nome, mas por que se preocupar com isso? Se fosse publicar uma HQ, tudo bem, haveria os direitos autorais, blablablá. Ia usar o nome em um herói de verdade, carne e osso, podia chamá-lo como quisesse. Foolkiller, o matador de idiotas, outro nome forte. Não, Solução Final estava legal.
2009 foi o ano da preparação intensa. Selecionou alvos, desdobrou-se para atender a família, fez alguns cursos de mecânica para satisfazer a mulher e melhor preparar-se para empreender a missão de sua vida e adquiriu todo material que julgava necessário possuir a fim de eliminar corruptos com eficiência.
2010 será o ano da mudança, acredita. Sebastião estava louco para entrar em ação, mas a mulher queria passar o carnaval em Cabo Frio. Estava trabalhando como louco para levantar dinheiro. Iam alugar uma casa por 10 dias. O cunhado, como sempre, iria na aba com mulher e três filhos. A sogra estaria lá.
O Solução Final começaria os trabalhos depois do carnaval. Os corruptos não perdem por esperar. 

quinta-feira, janeiro 28, 2010

COISA BONITA DE SE VER - Brigitte Bardot



Brigitte Bardot  e Marilyn Monroe foram os maiores símbolos sexuais do cinema. Em minha opinião, pelo menos. Talvez a Jane Fonda de Barbarella pudesse juntar-se a esse seletíssimo grupo.
Hoje qualquer mulher melancia é considerada símbolo sexual. Não sei, acho que não é bem assim.

CONEXÃO


Crédulo ficou novamente sem Internet. OI Velox, sacumé. Teclou 10331, passou pelas máquinas e ouviu:
– Boa tarde, Marília, em que posso ajudá-lo?
– Ô, Marília, é Crédulo.
– Querido, tô chateada. Ontem, você não quis falar comigo?
– A Inês atendeu, ficava chato te chamar. As meninas, como estão?
– Vão bem, querido. A maiorzinha tá gripadinha, mas não é nada demais.
– Uberlândia, sempre progressista?
– Ó! Você precisa aparecer por aqui.
– Qualquer dia apareço. Marília, é o seguinte: continuo sem Internet.
– Chato, né? Vou te passar pro suporte técnico.
– O Jairo tá lá, agora?
– Não, saiu de férias. Ele estava precisando. O clima em Feira de Santana tá pesado. Muita gente reclamando. Isso esgota a gente.
– Ai, quem será que vai me atender? O Jairo nunca resolveu meus problemas, mas ele é atencioso.
– Vou te encaminhar pra Elisa. É gente boa.
– Obrigado. Dá um abraço no pessoal. Amanhã devo ligar de novo.
Crédulo creu que seu problema seria resolvido. Se não fosse, ao menos conheceria alguém novo. Desde que sua Internet, dia sim outro também, saiu do ar travou camaradagem com muita gente da OI Velox. Amigos mineiros, baianos, capixabas, manauaras... Nenhum deles fez o Velox voltar, mas aí também era querer demais.
– Elisa, em que posso ajudá-lo?
– Elisa, estou sem Internet há uma semana. Na realidade, há três meses minha conexão é intermitente. Em média, tenho Internet dois dias por semana.
– O senhor sabe que isso não é ruim? Há muitas pessoas se isolando do mundo por causa de Internet. Deixam de interagir com pessoas reais e se envolvem com personagens virtuais. Digo personagens porque...
– Elisa, por favor, uso a Internet a trabalho. Os clientes me passam serviço por email.
– Perdoe-me a indiscrição: o senhor tem clientes fora da sua cidade?
– Não, mas...
– Então, senhor, por que não manter contato direto com eles? É ótimo quando mantemos relacionamentos olho no olho. Até mesmo os profissionais. Para que Internet? As pessoas estão acomodadas. Não saem de casa. Pedem tudo pela Internet.
– Sei que você está sendo gentilíssima comigo, mas o Rio de Janeiro é cidade grande. O que você me sugere é inviável. E, afinal de contas, pago mensalmente à OI Velox a prestação desse serviço.
– O senhor faz muito bem. É o que sempre digo, vale a pena sermos corretos no pagamento de nossos compromissos.
– Mas precisa haver a contrapartida que, neste caso, é a prestação do serviço.
– O senhor contratou que velocidade de acesso?
– 1 mega.
– Que tal passar para 4 megas? Estamos com uma promoção fabulosa.
– Eu estou sem conexão.
– O senhor me disse que em dois dias da semana há conexão.
– É, às vezes.
– Então, senhor, nesses dois dias a conexão será quatro vezes mais rápida.
– Elisa...
– Crédulo. Posso chamá-lo assim? A Marília me disse que você é um bom amigo.
– É verdade. Falo mais com ela do que com minha mulher.
– Crédulo, vai por mim, não perca essa promoção.
– Tudo bem. Falo com você?
– Não. Vou te passar pro Juan. Não estranhe o sotaque. Nosso departamento de vendas é em Assunção, no Paraguai.

quarta-feira, janeiro 27, 2010

IMPRESCINDÍVEIS



– Sem o Filipe e o Ricardo não dá pra começar a pelada.
– Ricardo já está aí. Alá a bola dele. Foi à padaria tomar um sorvete.
– E o Filipe?
– A mãe dele disse que ele só vem depois de estudar.
– Filhinho de mamãe, mas sem ele não tem jogo.

A Rua Alberto Limonta tinha configuração hostil aos adeptos de uma boa pelada. E logo ela havia escapado do intenso tráfego que invadia as outras ruas do bairro. Sem espaços para um campinho, a garotada se virava no velho futebol de rua.
A Rua começava com ladeirinha leve e terminava em subida inclemente. Era comum os infelizes que moravam lá no alto, antes de começar a escalada, soltar uns dois putaquepariu e três ou quatro cacildas.
Entre a tênue subida e o paredão, havia 50, 60m de planície. Infelizmente, quis o Tinhoso que no metro 20 do paraíso morasse d. Rosaura. A feladaputa da velha tinha dois prazeres na vida: rasgar as bolas que caíam em sua casa e atirá-las rasgadas na rua.
Em 2010, d. Rosaura já estaria morta. Um dos peladeiros já haveria providenciado sua ida para a cidade dos pés juntos. Naquela época, no entanto, a molecada se conformava em malhar a velha, transmutada em boneco, no Sábado de Aleluia. Era o judas oficial da rua. D. Rosaura, era ela em nossas mentes, levava porrada até as entranhas de algodão saírem. Depois a queimávamos. Antes, por alguns dias, o boneco ficava exposto no poste, com o nome da velha seguido de qualificativos criativamente desabonadores.
Soluções havia. Jogávamos no começo da rua, muitas vezes. Início de partida, atacar subindo a ladeira era tranquilo. Dez minutos de jogo e parecia que os atacantes escalavam o paredão do final da rua. Já quem atacava para baixo ganhava velocidade vertiginosa. Quase sempre os bolivianos venciam.
No platô, jogávamos a pelada de sábado. À tardinha, fazíamos dois times de 8 e jogávamos à exaustão ou até um grosso atirar a bola além dos muros da velha aloprada. A bola caía dentro da casa de d. Rosaura e minutos depois voltava retalhada.
Perdíamos duas a três bolas por mês. Hamilton, certa vez, quase agrediu a velha. Por causa dela, seu prestígio com a rapaziada andava baixíssimo. As últimas três pelotas foram isoladas por ele. No rachuncho para comprar bola nova, o grosso perpetrador do crime de enviar a gorduchinha para o colo da velha sempre entrava com a metade do valor. Justíssimo, então, ter Hamilton quase agredido a anciã dentro da padaria. Sorte da retalhadora o fato ter-se dado em hora de pão quentinho. Muita gente esperando a bisnaguinha, muita gente para segurar o galalau enfurecido. Daquela a velha escapou.
Quase ao mesmo tempo chegaram dois novos moradores na rua: Filipe e Ricardo.
Ricardo morava no casarão do início da rua. Nós o víamos como um milionário. Garoto bacana, bom jogador, excelente amigo, brigava bem e, principalmente, era um mão-aberta. As bolas passaram a ficar por conta dele. Nunca mais precisamos comprar redondinhas. Até o Hamilton voltou a jogar.
O inconveniente é que, às vezes, um ignorante rifava o balão de couro logo no começo da pelada. Como ninguém mais precisava comprar bolas, a velha cautela do jogo mais suave nas imediações da casa maldita foi pras cucuias. Antes os zagueiros se preocupavam em virar o corpo para porrar a preciosa em direção oposta à do antro da devoradora. Agora, jogavam como odvans: chutavam para onde apontava o nariz. Por mais perdulário que fosse, Ricardo não punha outra bola em jogo no dia de tragédia. Só na próxima pelada. E até isso um dia acabaria, intuíamos todos.
Filipe chegara à Rua menos de um mês depois de Ricardo. Não se entrosou com ninguém. Quando fomos batizá-lo, quase a mãe dele chamou a polícia. “Se encostarem um dedo no meu filho, mato um”. Ninguém duvidou que ela mataria um, dois, três... Quantos fossem necessários.
Enquanto Ricardo era adorado, por Filipe nutríamos indiferença. Ele, por sua vez, não se preocupava em fazer amizade com ninguém. Filho único, a mamã o paparicava de maneira ultrajante. A irmã, um ano mais nova, era um petisco que todos sonhávamos saborear.
Não só esses eram os defeitos do Filipinho. Bom, a irmã entra na coluna das qualidades. Voltemos ao defeito, o mais grave: era menino de recados de d. Rosaura. A mamã dele conhecia a velha de outros enterros. Vivia na casa da megera. Filipinho comprava pão, buscava cerveja preta e escolhia frutas para a bruaca, sempre na maior alegria. Até a feira o pilantrinha ia com a vovó, no maior carinho. Como gostaríamos de cobrir Filipinho de porrada.
Em bela tarde outonal, os dois irmãos resolveram apreciar a pelada que ia animadíssima. Ricardo já havia mandado duas ou três letras para a menina. Ele era o mais experiente entre todos nós. A fofinha, lá pelas tantas, pediu: “Por que vocês não deixam meu irmão jogar?” Todos fingimos que não ouvimos. Ricardo, não. Cedeu sua vaga, cavalheirescamente, e foi postar-se ao lado da uvinha. Hamilton irou-se pela entrada de Filipinho e muito mais pela ousadia de Ricardo. Ele anunciara para todos o seu interesse na menina. Fizera reserva. Ricardo não respeitou. Tão puto ficou que relembrou os velhos tempos e rifou a bola dentro da casa de d. Rosaura.
Antes que reagíssemos, Filipinho correu em direção a casa e, com a familiaridade de um molequinho de favores, foi entrando. Segundos depois saía com a bola. A primeira a sair viva da mansão ignominiosa.

– Ó, o Filipe tá vindo.
– Pô, Filipe já estamos te esperando há mais de meia hora.
– Minha mãe tava passando a lição comigo. Vou comprar pão pra ela e a gente começa.
– Aí, cunhado, vou lá com você.
– Hamilton, pare com isso. Se minha irmã te escuta...

sábado, janeiro 23, 2010

CRÉDULO

Sem Internet, o crédulo liga pra assistência técnica da OI Velox.
Depois de driblar as muitas máquinas, o crédulo ouve voz aparentemente humana.
– Boa tarde, em que posso ajudá-lo?
– Estou sem Internet. É meu instrumento de trabalho, gostaria de saber o que está havendo?
O crédulo é um inocente. Crê, firmemente, que suporte técnico tem ciência do que diz.
– O senhor já verificou as conexões? A tomada está ligada?
– Já verifiquei tudo, mas olharei novamente.
– ...
– Está tudo ok.
– Clique em Painel de Controle para verificarmos as configurações.
Os próximos 10 minutos, o crédulo passa ouvindo a autoridade em Informática dizer vários números que deveriam ser digitados no lugar dos outros que lá estavam. Mesmo sendo um jumento, e não só em tecnologia, o crédulo pensa que aqueles números que lá estavam funcionaram tão bem até uma hora atrás, qual a razão de agora estarem errados.
– E aí, senhor, a conexão voltou?
– Não.
– Tem chovido muito por aí?
– A chuva pode ter causado o defeito?
– Não, me desculpe, é que estou em Uberlândia e vou este fim de semana pro Rio.
– ...
– Senhor, estão ocorrendo reparos emergenciais em sua região, a conexão deve ser restabelecida até as 16h.
O crédulo pensou por que o técnico o tinha feito se abaixar, se enfiar por trás dos móveis reconectando fios, se aporrinhar com aquela numeralhada toda para, no fim, informar que o problema era da empresa?
– Obrigado, às 16h, se não houver solução, ligo de volta.
O crédulo, burro mas boa gente, ligou mais umas três vezes. Conectou e reconectou fios. Ouviu, no final, as três vezes, que estavam fazendo reparos em sua área. Imaginou ter ouvido risadas abafadas, as três vezes. E a Internet como foi, voltou. Misteriosamente.

sexta-feira, janeiro 15, 2010

ISRAEL



Metrô vazio. Milagre, principalmente depois do choque de ordem. Sem baldeação está vindo gente de Araruama passear no trem subterrâneo, dizem as autoridades.
Entrei, sentei e, do meu lado, um empresário não largava os celulares. Em um ele falava, no outro gerenciava os emails.
– À noite tenho uma reunião... Depois?... Pode ser... Que horas?... Fechado, dou meu jeito, nos encontramos às 22h da noite.
No banco em frente, um pai e seu pimpolho. Pimpolho esperto.
– Pai, 22h da noite não está errado?
O pai olhou pro filho de cara feia.
– Israel, cala a boca.
O garoto insistiu.
– Pai, você não me disse que ou a gente fala 10h da noite ou 22h? Que 19h da noite, 20h da noite é burrice?
O empresário guardou o celular dos emails no bolso e olhou atravessado pra criança. Virou-se pro pai constrangido e mandou:
– O seu filho é muito inconveniente. Fica prestando atenção na conversa dos outros pra corrigir.
O pai, claro, saiu em defesa do inocente.
– O senhor está falando alto, o vagão inteiro está ouvindo sua conversa. É uma criança. Como dei esse exemplo pra ele noutro dia...
– Por que 22h da noite está errado? Quis enfatizar.
– 22h só pode ser da noite.
– Olha, meu amigo, sou um cara de paz, mas tá faltando pouco para mim fazer uma bobagem.
O pai, apavorado, tentou cobrir a boquinha do filho, mas o moleque era rápido.
– Ahhhh! Esse cara é burro mesmo. Não é para mim fazer. É para eu fazer.
O empresário ia partir pra ignorância. Segurei-o, enquanto pai e filho escapavam na providencial parada do Metrô. Não sem antes o pequeno Israel parar e tripudiar:
– Burro, burro, burro.
O empresário voltou a ira para mim.
– O senhor não tinha de se meter... Não tinha de se meter.
– Meu amigo, se você agride uma criança vai preso e o pessoal pode até linchá-lo – ponderei.
– Eu não tenho nada com os pessoal. Quero que os pessoal se danem.
Virei pro lado, abri meu livro e pensei: “se o pequeno Israel ainda estivesse por aqui ia ter morte”.

segunda-feira, janeiro 11, 2010

PETER TOSH



Estou ouvindo Peter Tosh.
Impressionante como o reggae produzido na pequena Jamaica dominou o planeta.
Ponha o Vagarosa, da celebradérrima Céu, e ouve-se reggae.
Peter Tosh, Bunny Wailer e Bob Marley conquistaram sua terra e depois o mundo com a hipnótica música que fizeram. Catch a fire é um dos discos mais assombrosos que ouvi. Foi o primeiro da dominação planetária conduzida pelos Wailers.
Todos se separariam. Marley foi o mais popular. Tosh, no entanto, era tão genial quanto ele. Bunny ficou pela Jamaica. Parece que nunca se interessou muito pelo sucesso.


Peter Tosh fazia música engajada de qualidade. Levou muita porrada na Jamaica. Saiu de lá, conheceu a fama e a glória, e foi assassinado em Kingston, em episódio malexplicado.
Se você é chegado a uma ganja, a música de Tosh deve descer redonda. Digo deve porque sempre fui careta. Tenho certeza, no entanto, que o mais próximo que cheguei de um barato foi ouvindo Tosh. Crystal Ball nas caixas.

sábado, janeiro 09, 2010

COISA BONITA DE SE VER - Zooey Deschanel



Zooey Deschanel é uma gracinha e não só isso.
É boa atriz e manda bem cantando.
Confira em Volume One, do She & Him.

PRIMEIRO VOTO


Quinta-feira, li um texto tão bom, escrito pela Cora Rónai, em O Globo, que fiz algo quase inédito em minha vida: enviei texto elogioso para um colunista. Lembro-me que só uma outra vez tomei atitude semelhante, quando encaminhei opinião para outro colunista que gosto de ler: Arthur Dapieve (agora mesmo, ouço The Wall influenciado pela leitura da coluna dele).
Não tenho a menor pretensão de reformar o mundo, mas resolvi, depois desse meu descabaçamento, que todo texto prazeroso que ler, em qualquer lugar, será acompanhado de uma carinhosa missiva escrita por este Gordo com sinceros agradecimentos ao autor.
Rotineiramente, leio duas revistas semanais, três ou quatro mensais, jornais diários, sítios de internet e outros parangolés legíveis que caem em minhas mãos. 95% do material que empurro para dentro do meu cérebro segue diretamente pro intestino e de lá para o esgoto, onde empreendem viagem rumo ao oceano com seus legítimos irmãos, os cagalhões. Por que então não valorizar os 5% de preciosidades que envio pro cérebro e lá ficam?
Este é meu primeiro voto de 2010: elogiar os que merecem elogios.

quinta-feira, janeiro 07, 2010

PIN-UPS - As mulheres antes do Photoshop


Lily Allen, claro, é exceção. É pin-up moderna. Quando precisa é photoshopada. Mas acho que ainda não é o caso.

GONZAGA



Gonzaga era querido na comunidade. Cara alegre, prestativo, integrado.
Pau pra toda obra, apesar de na comunidade as casas serem todas de tijolo, porque esse negócio de barraco de madeira já foi.
Mas, como apregoa Pierre Cliché, a vida é uma caixinha de surpresas. O bom Gonzaga teve um colapso e finou-se.
Consternação total. Gonzaga deixou mulher e uma filha de 12 anos, Giovana.
Cerqueira, presidente da Associação de Moradores da comunidade acercou-se de Sheila, a viúva, e propôs:
– Sheila, conheço o Gonzaga há mais de 30 anos. Eu o trouxe pra cá. Fui padrinho do casamento de vocês. A Associação paga enterro e qualquer outra despesa, mas você tem de permitir que eu faça duas coisas: chamar a primeira mulher dele com os filhos e convidar o pr. Bocaiúva para fazer a cerimônia fúnebre.
– Eu aceito, até porque acho que não é momento de rancores, mas gostaria que o enterro fosse no Jardim da Saudade e que a Associação providenciasse ônibus para levar as pessoas da comunidade.
– Vou alugar três ônibus. O Gonzaga era muito querido e respeitado.
O enterro no dia seguinte reuniu mesmo uma multidão. Os três ônibus foram abarrotados. O pr. Bocaiúva chegou a comentar com Cerqueira:
– Que bênção, Cerqueira. A Palavra será pregada e, certamente, não voltará vazia. Deus vai me usar, poderosamente, para falar a esses descrentes e obra magnífica será realizada. Tudo para honra e glória do Senhor.
– Não seria melhor fazer a cerimônia aqui na Associação, pastor?
– Vamos fazer no cemitério, lá haverá mais almas. As daqui e as dos parentes do primeiro casamento.
Sol escaldante, multidão espalhada pelo gramado do cemitério e o pastor falava, falava e falava. Não contente de só ele falar, abriu espaço para que quem desejasse dissesse alguma coisa sobre o irmão Gonzaga. Irmão por conta do sacerdote. Gonzaga jamais havia pisado em igreja evangélica ou católica. Era conhecido filho de Ogum.
A segunda mulher de Gonzaga aproximou-se do microfone:
– Todos sentiremos muita falta do Gonzaga. Um homem que conquistou toda a comunidade com sua simpatia, seu sorriso, sua prontidão. Gonzaga estava sempre bem-humorado, feliz. Mas, meus amigos, é bom que se diga que nem sempre foi assim. Há 15 anos, quando nos conhecemos, Gonzaga era infeliz, amargurado, torturado. Graças ao supremo criador de todas as coisas, ele viveu feliz os seus últimos anos.
O pr. Bocaiúva olhou para o público e viu uma mulher se aproximando. Cerqueira sussurrou em seu ouvido: “É a primeira mulher do Gonzaga”.
A lourona trovejou:
– Fui casada com o Gonzaga por 16 anos. No início de nosso matrimônio tínhamos uma mercearia que existia há mais de 40. Herdei-a de meu pai e nela trabalhei desde a meninice. Quando me separei do Gonzaga, a mercearia estava falida. Depois de separada comecei outro negócio, que vai muito bem. Tenho dois filhos na faixa dos 20 anos. Criei-os sozinha. Nunca tive ajuda do Gonzaga. Acabei de ouvir que ele vivia feliz. Como, se estava sempre me pedindo dinheiro emprestado, reclamando da vida, suplicando preu aceitá-lo de volta porque não aguentava mais morar na favela.
A essa altura, o pr. Bocaiúva sentiu que a coisa ia desandar, mas não negou a palavra ao Cerqueira.
– Meus amigos, todos sabem que conheço o Gonzaga há mais de 30 anos. Conhecia-o quando era casado com a Clotilde. Eles se separaram por circunstâncias da vida. O que não podemos é lançar lama na reputação de um homem que deu a vida pela comunidade.
Silvério pediu o microfone e o pr. Bocaiúva não sabia mais o que fazer.
– Amados, em primeiro lugar, um reparo. É inapropriado chamarmos de irmão um homem que não pertence a nenhuma igreja cristã. Em segundo lugar, gostaria de perguntar o que, exatamente, o Gonzaga fez pela comunidade? Era um camarada simpático e que cumprimentava a todos. Só isso. Prestativo? Nunca soube que ele socorreu alguém, jamais o vi participando dos mutirões. Lembro-me dele participando das peladas, reunido no boteco assistindo jogo pela TV e gritando, ébrio, em todos os gols do Botafogo: “Esse time me faz sofrer, mas é também o que me faz aturar esta vida de merda”. Perdoem-me por usar esta palavra torpe, amigos.
O pr. Bocaiúva percebeu que tinha de dizer alguma coisa. O quê?
– Meus amigos, a quem honra, honra. Temos de dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. Afinal, não é a Bíblia a palavra inerrante de Deus, nossa regra de fé e prática? Acalmemo-nos, então, e prossigamos com o enterro.
O filho mais velho de Gonzaga tomou o microfone do pastor e falou exasperado:
– Meu pai sempre traiu minha mãe. Roubou-a. Ela, não sei por que, sempre o amou. Não o aceitou de volta por nossa causa, os filhos. Ele já a havia levado à falência. Ela fez questão de vir aqui. Nós viemos por causa dela. Ele era um canalha.
O pr. Bocaiúva arrependia-se por ter começado aquela bagunça.
– Me deixa falar.
Era a filhinha de 12 anos de Gonzaga.
– Papai não era nada disso que vocês estão dizendo. Ele me ajudava com as lições de casa, me dava conselhos, me perguntava sobre como tudo ia no colégio, sempre ligava para saber se eu precisava de alguma coisa. Era o melhor pai do mundo. Todas as noites, depois que mamãe dormia, ele ia ao meu quarto e beijava minha boca. Beijo de língua.

quarta-feira, janeiro 06, 2010

PLANO DE CARREIRA



Verinha era menina bonita, responsável, tinha bom emprego e apenas 20 anos.
Os pais orgulhavam-se da filha.
O irmão, João, era músico de talento reconhecido. Aos 18, tocava em um grupo de MPB que lhe rendia uns trocados. Abandonou a escola e dedicava-se à música, integralmente.
Os pais orgulhavam-se do filho. Tinha prestígio. Até na TV já aparecera.
A caçula, Joaninha, aos 17 já alcançara a independência financeira. Quando completou 15 anos, disse pros pais: “Vou ser garota de programa. Preciso aproveitar meu apogeu físico. Vou leiloar meu cabaço pela Internet, depois faço programas por uns dois, três anos. Registrarei tudo. Será material para um livro. Talvez precise dizer, papai, que você abusou de mim quando eu tinha 12 anos. E você, mamãe, direi que se omitiu. Em talk shows dá o maior pé esse tipo de história. Acho que depois do livro rola filme, peça de teatro, programa de TV”.
Os pais orgulhavam-se de Verinha.
Orgulhavam-se de João.
Mas Joaninha... Dos três, foi a única que sempre teve um plano de carreira.
Estava na TV. Foi comovente o programa em que ela contou os abusos que sofrera, mas perdoava os papais que tanto amava. O livro vendia horrores e o filme estava engatilhado.
O cabaço valeu um apartamento.
Inacreditável!
Não era pra se orgulhar de uma filha assim?

segunda-feira, janeiro 04, 2010

FATALIDADE, ACASO, SORTE, DESTINO...


Sou fatalista.
O que tem de ser é.
No deslizamento de terras na Ilha Grande, morreram turistas e ilhéus.
Lamentei pelos ilhéus, mas minha atenção voltou-se para os turistas.
Os 11 de uma cidade do interior paulista.
Reuniram-se durante o ano, planejaram a temporada na Ilha, antegozaram as delícias do mar.
O mais pessimista do grupo deve ter perguntado: “E se chover?”
Choveu.
Chuva que atrapalhou o banho de mar, que moveu a terra, que matou.
Os três amigos.
Entre eles, a jovem filha do dono de uma pousada.
Nenhum hóspede da pousada morreu.
A adolescente tinha um quarto especial para ela. Ficou intacto.
Na hora do deslizamento, a menina estava no quarto dos amigos.
Este quarto, sim, foi soterrado. Os três morreram.
Fatalidade. Acaso.
Penso como os antigos: “Todos têm sua hora”.
Uma merda isso.