domingo, fevereiro 12, 2012

O PULGÃO



Como dizem os boleiros: “A vida é uma caixinha de surpresas”. E é mesmo.
Encontrei um conhecido na Saraiva, papeamos rapidamente e ele me convidou para um café. Mal sentamos e ele começou a discorrer sobre os mais variados temas: Império Romano, A juventude de Hitler, Mona Lisa, Revolução Industrial, presídios de segurança máxima e outras porrocas. Fiquei pasmo. Aquele cara na minha frente só falava de futebol, mais especificamente, sobre o Vasco. Tinha horror a ler qualquer coisa. De onde viera aquele monte de informação?
Animei-me. Mandei um tema: o rigoroso inverno europeu. Ele me confessou que vira alguma coisa nos noticiários, mas pouco sabia. “E a greve de policiais e bombeiros, você é contra ou a favor?” “Greve, que greve?”, rebateu o desinformado. Fui pro outro lado do mundo. “E a China, hein?” Ele despertou. “Semana que vem tem um documentário no Discovery. Não perderei.”
Ao ganhar novo alento, o colega retomou o controle da prosa e me explicou em detalhes como vive o pulgão dos pampas. Deve ter visto isso no Animal Planet.

sábado, fevereiro 11, 2012

OTITANDO


Não quero conflituar com você. Lembre-se que foi você que estartou esta discussão. Eu, em momento algum, afirmei que sua relação com a Dani estava colapsada. Ela me procurou, sim. Me disse que estava com borboletas no estômago. Tudo por causa do novo emprego, a nova função. Enquanto manicure, ela sentia-se segura, mas, agora, assumindo a vaga da designer de unhas, a insegurança bateu. Esse email que você printou e está me mostrando não revela nada diferente do que falei até o momento. Dani é uma mulher diferenciada, uma guerreira e ama você. O meu agir com ela tem sido sempre dentro do maior respeito. Somos amigos e só abdicarei deste status se ela assim o desejar.
Amado, se você continuar com esse ciúme, vai perder a mulher. Estar emocionalmente ligada a você não tem agregado valor à vida dela. Dani é dona de inteligência emocional formidável.
Veja bem, amado, considere o que lhe digo. A nível de comemorabilidade, este momento de promoção profissional pelo qual ela passou era para ser vivido com você, no entanto, ela me chamou para chorar pitangas. Examine-se, procure perceber o seu sentir. Faça isso, rapidamente. Foque no que importa, sem descuidar-se dos detalhes. Ela o ama, mas muitas vezes só o amor não basta. O amor constrói.
Amado, espero ter esclarecido tudo. Vou nessa. Um beijo no coração. Preciso passar na costureira pra pegar minha fantasia. Este ano sapucarei. 


sexta-feira, fevereiro 03, 2012

COISA BONITA DE SE VER - Aristazabal Hawkes, baixista do Guillemots


GOSTO DE DINHEIRO, MAS...


Gosto de dinheiro.
A vida toda, sempre tive muito pouco. Faltou-me disposição e vontade para fazer fortuna. Estranho, mas não condeno, jovens que sonham acumular o primeiro milhão. Perto dos 60 anos, gostaria de ter sido menos perdulário ao longo da vida.
Gosto de dinheiro.
Muitos gostam. A maioria venera. E os que idolatram o dinheiro e a vida confortável que ele proporciona fazem coisas que, caraio, fico pasmo.
Gosto de dinheiro, mas afirmo: não teria coragem de desviar remédios de pacientes terminais para ter bom apartamento, carro de luxo, vida mansa. O que fazer com criminosos que não têm o menor escrúpulo em cometer esse tipo de atrocidade?
Neste caso do desvio dos remédios para pacientes com câncer, os envolvidos são um bandido de almanaque (preso e chefiando os cúmplices do xadrez), dois ou três marginais de carreira e uma dezena de gente como a gente. Aliás, como a gente não. Quero acreditar que sou melhor do que isso.

quinta-feira, fevereiro 02, 2012


O ALBATROZ
Charles Baudelaire

Às vezes, por prazer, os marinheiros 
Pegam um albatroz, essa imensa ave dos mares, 
Que acompanha, indolente parceiro de viagem, 
O navio a singrar pelos golfos. 

Tão logo o estendem sobre as tábuas do convés, 
O monarca do azul, canhestro e envergonhado, 
Deixa pender, como um par de remos junto aos pés, 
As asas de um branco imaculado.

Antes tão belo, como é feio caído em desgraça 
Tão fraco e desajeitado, até mesmo cômico! 
Um, com o cachimbo, lhe enche o bico de fumaça, 
Outro, a coxear, imita o enfermo que outrora voava!

O Poeta é como o príncipe da altura 
Que enfrenta os vendavais e ri da seta no ar; 
Exilado no chão, em meio à multidão obscura, 
As asas gigantes impedem-no de andar.