domingo, junho 23, 2013

BOLAS AO VENTO


Quando menino, corria peladinho pelas quebradas da Serra, nariz escorrendo catarro... Mergulhava nas águas barrentas do Rio Everest, nadava até a ilhota de entulhos e punha-me a pensar na vida. Imaginava a Serra governada por pessoas eleitas por toda a comunidade. Essas pessoas, obviamente, se organizariam em grupos com ideias afins. Estas ideias seriam expostas à comunidade que escolheria os portadores das melhores a fim de que estes as implantassem por um período de, vamulá, quatro anos.
Depois de eleito, o grupo trabalharia sem ser atrapalhado pelos adversários. Estes adversários, se pudessem, deveriam, inclusive, ajudar os oponentes. Sacumé, pro bem do povo, como todos gostam de dizer. Só se voltaria a falar em eleições bem pertinho da próxima.
Como criança é simples, tosca e imaginosa, em meus delírios (acho que era efeito de minhas bolas ao vento) via os grupos adversários se reunindo periodicamente para pensar no que deveria funcionar muito bem, independentemente de quem ocupasse o Barraco Branco: saúde, educação, segurança e transporte. Investimentos e providências para manter funcionando bem essas quatro áreas não seriam interrompidos.
Fui uma criança primitiva, cheia de pensamentos selvagens e tolos. Não sabia ainda da boa disposição de todos nós, seres humanos, de empurrar para o outro a responsabilidade pelos malfeitos. Vovó e eu caçávamos ratazanas no lixão e ela sempre me dizia: “Esqueleto, filho feio não tem pai”. Estava certa. Essa frase de vovó e uma outra, do Bochecha (“Farinha pouca, meu pirão primeiro”), me fizeram perder a inocência.
Daí pra frente passei a andar vestido. Nunca mais bolas ao vento.

2 comentários:

Belchior disse...

porrr... uma calhamaço de textos que não li... tenho que por a leitura em dia.

elienar disse...

Fantástico...