quinta-feira, junho 13, 2013

BOM TEMPO



Religião é parada estranha, no entanto, sempre fui religioso.
Na pré-adolescência, influenciado pela umbanda, religião de meus pais, acendia velas por qualquer motivo. Se queria alguma coisa, antes de me esforçar para conseguir o que desejava, prometia a uma entidade qualquer um determinado número de pacotes de velas.
Antes de entrar na escola, todos os dias, iluminava a Igreja Perpétuo Socorro com as velinhas. O filminho na Praça S. Pena era precedido por uma passadinha na Igreja Santo Afonso. No dia em que quase incendiei a casa onde morava, resolvi parar com aquela babaquice, mas logo vieram outras.
Antes de umbandista, fui católico. Ia à missa na Igreja de São Cosme e Damião. Era uma tortura. Tem de ter saco de filó pra aturar missa. Sessão de umbanda, não. É uma delícia. Pelo menos para mim, era.
Em dias especiais meus pais me levavam ao Centro. O casarão branco de d. Belinha se destacava na Teodoro da Silva. Subíamos uma escadaria para chegar lá. Embaixo, o campo do América (hoje, o espaço é ocupado pelo Shopping Iguatemi). Nós, crianças, ficávamos em um salão na parte de cima da casa. Éramos convocados quando iniciava a gira de crianças.
As sessões eram animadas porque havia movimento intenso e as crianças incorporadas em adultos nos divertiam demais. Pense em alguém seriíssimo comportando-se como criança birrenta. Era isso que rolava.
Minha tia Janete era a criança mais bonita e alegre (Zarara, se não me falha a memória). D. Leonor, uma vovozinha simpática, a mais chata. Ela enchia a boca de doces, cuspia-os de volta na mão e os passava na boca dos incautos. A diversão era ficar longe dela e sacanear os desprevenidos.
Ver minha mãe se comportar como criança era estranho e hilariante. Quando ela recebia Tia Rosa, era uma velha; montada por Sete Caveiras, sinistra.
Num canto do terreiro, no castigo, quase sempre ficavam médiuns que estavam se desenvolvendo e faziam alguma lambança antes de aparecer na sessão (faltas, bebidas etc.). No Centro da d. Belinha, ficavam no cantinho, ajoelhados, e não podiam se levantar. Quando desobedeciam, o espírito incorporava e os jogava no chão. Impressionante. A relação dos indisciplinados era cheia de figurinhas repetidas: meus tios Zeca e Arari, Alcides e Moacir.
Lembro-me de ter visto o Alcides, um negão de 1m90 e mais de 100kg, sendo atirado de um lado pro outro, dentro do terreiro, por forças invisíveis. Naquele dia deve ter feito merda grande.
Aos vinte anos ingressei em uma igreja evangélica. Foi uma boa decisão, mas perdi muita coisa da vida, desnecessariamente. Afastei-me de amigos, família. Não responsabilizo ninguém. Culpa de minha ignorância. Isso, lamentavelmente, só sei agora.

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