sexta-feira, dezembro 04, 2009

DONO DO PEDAÇO

Fácil não seria.
Juju acabara de sair de um tumultuado romance.
O ex era soldado, homem de confiança do Homem.
De qualquer forma, Dorival não era de perder oportunidades. Sondou pra se informar se a menina estava mesmo liberada ou se estava no castigo. Liberação feminina era coisa lá de baixo. Na comunidade, as minas eram vadias, cachorras, e muitas adoravam isso, e quando se envolviam com o pessoal do movimento viajavam ao passado e viviam em tempos bíblicos, veterotestamentários. Só o macho da espécie podia repudiá-las.
Na discretíssima apuração, soube que AK dispensara Juju, que era a terceira fêmea do pedaço à sua disposição. Dorival não pôde deixar de pensar. Se Juju, tesão dos tesões, companheira imaginária de suas noites insones, era a terceira, as outras duas, putaquepariu.
Um amigão ainda lhe deu toque esperto. Dá um tempo, espere pra ver se AK se adapta à nova mulher e depois se aproxime.
Dorival acatou a orientação. Estava afoito, mas não queria morrer aos 19 anos.
Na escola, namorou Juju. Beijinho pra lá, beijinho pra cá. Conheceu mãe, pai. Almoçava na casa da gata de vez em quando. Mas Juju era jogo duro e ele queria porque queria comer aquela prenda. Não comeu, comeu uma outra, Juju soube e o dispensou.
A dor de corno foi grande. Mesmo corno não sendo. Correu atrás, chorou, se humilhou, pediu ajuda dos, quem sabe um dia?, futuros sogros. A menina estava e permaneceu irredutível.
Antes dos 18 ela desfilava com AK. Ele, ainda desconsolado, foi abordado pelo ceifador. “Aí, a mina tá comigo. O primeiro aviso é pra você ficar longe; o segundo não haverá, te encho de porrada e bala. Depois te queimo.”
AK era homem convincente. Nunca mais chegou perto de Juju. Olhava-a de longe, com medo, pavor, terror, amor, desejo, angústia.
Uma tarde, em plena Uruguaiana, Juju segurou em seu braço. Quando viu que era ela, se desmanchou de felicidade e horror. “Me arrependo tanto de não ter aceitado seu pedido de perdão. Você é o meu amor. Sou respeitada no morro, mas não tenho respeito por mim. AK tem duas mulheres, filhos, eu sou a cachorra.”
Saiu dali voado. Trabalhava, ganhava uma merreca, ajudava em casa, pagava faculdade, tudo pra sair do lugar em que vivia. É uma merda um lugar onde um homem não pode ganhar uma mulher no papo.
Esperou o período de adaptação de AK. Pediu a Juju, por email, que lhe desse nova oportunidade. Ela deu a oportunidade e quis dar outras coisas tantas vezes negadas. Queria dar logo. Se tivesse se deixado levar pela palpitante cabeça que vivia entre suas pernas cairia, imediatamente, nos braços da bela Juju.
Antes do batente e de embarcar no trem, Dorival tomava seu cafezinho frugal na padaria da saída da comunidade. Pão, manteiga, café com leite, olhe lá. Ao seu lado, no balcão, o temido AK. Os olhares se cruzaram. AK mordeu o pão abarrotado de queijo, generosamente fornecido pelo dono da padaria, que tinha cu e medo, e disse afavelmente a Dorival:
– Fui informado que você está pensando em ficar com a Juju”.
Dorival protestou:
– Nada disso, esse pessoal fala demais.
– A parada é a seguinte, gosto daquela mina, mas não sou olho grande. Não estou dando a atenção devida a ela. Pode ficar, mas quando eu estiver a fim, vou chegar lá.
– AK, você é um cara generoso, mas, realmente, não tem nada a ver. A Juju é uma amiga, gosto da família, mas é só isso.
Dorival voltou em casa, se despediu da mãe, “vou ficar dormindo na empresa”, e caiu na poeira. A mãe morava na comunidade desde que nascera e de lá não sairia.
Alugou um quarto, começou um namoro com uma colega de trabalho, casou-se com ela e os dois foram viver em um conjunto habitacional na periferia.
Juju, não viu mais. De vez em quando, lembrava-se dela. Quando isso acontecia, trancava-se no banheiro e tocava uma bronha doída.

Um comentário:

Anônimo disse...

hahahahhahahahhahahahhaahaa..... pô, achei que o cara fosse fugir e casar com a Juju, e mais a frente sentir novamente as terríveis dores de corno. ahahahahahahahahhaha