quarta-feira, dezembro 09, 2009

PELO NÚMERO


Desembarcou do táxi e arrastou-se até a entrada do INSS.
Foi até o guichê. Encaminharam-no ao fundo da sala. Vão chamá-lo pelo número da senha.
Sentou-se. Cinco minutos depois foi chamado.
O funcionário anotou, teclou, anotou mais um pouquinho e orientou-o a esperar na sala à direita. Vão chamá-lo pelo número da senha.
Levantou-se, andou até a sala indicada, sentou-se e esperou.
De onde estava via todo o amplo salão. Do lado de dentro do balcão, gente estranha. Feios, todos. Falavam e não olhavam para aqueles com quem estavam falando, os do lado de fora.
O guarda que lhe informou o guichê onde deveria ir, ao entrar na agência, lia um jornal e dele não tirou os olhos.
A criatura enorme que lhe deu a senha devorava um saco de biscoitos e, preocupada com a eventual fuga de um dos recheados de chocolate, mantinha olhos atentos no pacote. A gordona comia, escondia os biscoitos com o corpanzil e passava as senhas.
O funcionário que checou seus documentos, por um instante fugaz, cruzou o olhar com ele. Desviou-o, rapidamente. Ficou tão perturbado com a imprudência que levantou-se e disfarçou bebendo um pouco de água.
Viu seu número no luminoso. Número 4.567, sala 5.
– Bom dia, doutor.
A resposta, um grunhido ininteligível.
O médico olhava com atenção a tela do computador.
Sentou-se.
– Por que o senhor veio aqui?
Fez as queixas, apresentou razões, mostrou que estava difícil trabalhar no estado presente.
Sem desviar os olhos do computador (será que estava jogando Paciência?), pediu os exames.
Passou a tomografia, exames de sangue, eletrocardiograma, teste da farinha... Todos condenando-o à morte próxima.
Apresentou laudos de ortopedista, cardiologista, angiologista, proctologista... Unânimes em considerar milagroso o fato de ele ainda respirar.
Ainda de olho na tela do computador (deveria estar vendo a Flávia Alessandra), grunhiu:
– O senhor pode ir. Em 15 dias uma correspondência chegará à sua casa deferindo ou não seu pedido.
Levantou-se, arrastou-se até a rua e fez sinal prum táxi.
Sentou-se no banco de trás. O motorista olhou em seus olhos e perguntou:
– Pra onde vamos?
Uma alegria difícil de conter tomou conta do homem:
– Graças a Deus voltei a meu mundo.

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