sábado, maio 19, 2018

CARA DURA



Uma revelação bombástica para alguns dos meus 200 parceiros feicebuquianos: evangélicos não encaram o mundo de forma igual. Somos diferentes entre nós e muitas vezes sinto o desejo de mandar se foder quem põe no mesmo saco todos os evangélicos. Só um exemplo: sou evangélico, mas garanto que não é bem visto entre meus irmãos de fé mandar alguém se foder. Eu mando, habitualmente.
Assisti ao papo furado na GloboNews sobre o casamento da fofíssima Meghan Markle com o príncipe vermelho. O sermão do episcopal afrodescendente norte-americano, convidado por Meghan, foi muito elogiado pelo grupo que comentava os diversos aspectos da cerimônia, principalmente pela menção a Martin Luther King. Um dos comentaristas fez um reparo, exatamente o reverendo episcopal convidado para falar sobre liturgia. Ele disse que, a não ser pela menção a King, todo o sermão era reprodução de um que ele ouvira há semanas. Um plágio, portanto. Risos sem graça da turma e outro assunto entrou em pauta.
Há anos perdi todo o respeito por um pastor. Depois de ouvi-lo pregar um sermão sob o tema “Cansados de fazer o bem” e ficar muito impressionado, me decepcionei ao encontrar o sermão, na íntegra, em livro de Martyn Lloyd-Jones, morto em 1981. Lloyd-Jones foi teólogo protestante, calvinista, de origem galesa e por quase 30 anos foi ministro da Capela de Westminster, em Londres.
Pregar o sermão alheio sem mencionar o outro era vergonhoso. Havia até os pastores que não achavam muito correto repetir os próprios sermões em ocasiões diferentes.
O pastor Hélcio Lessa, já aposentado na época, pregou na IB Itacuruçá baseado no texto de Romanos 12.2: “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito.” Entre suas ouvintes, uma muito atenta: minha querida esposa, Rosangela.
Dois anos depois, o pr. Lessa estava na pequena PIB do Recreio (hoje, enorme). Pregou o mesmo sermão de dois anos antes. Na volta para casa, voltamos na mesma carona, com o pr. Wander. Rosangela, sem maldade, virou-se para o pr. Lessa e elogiou o sermão: “Muito bom o sermão, pastor, mas eu gostei mais de quando o senhor o pregou em Itacuruçá”. Imediatamente, Rosangela percebeu a mancada, mas aí...
O pr. Helcio Lessa tinha humor ácido e devolveu: “Moça, o mundo é mesmo pequeno. Como eu iria imaginar que a mesma pessoa que me viu pregar numa catedral estaria, hoje, dois anos depois, nessa igrejinha de fim de mundo?” Todos rimos, menos o Wander, que sentiu a agulhada.
De qualquer forma, ele ficou constrangido por ter cometido autoplágio. Hoje, um pregador lança mão do sermão de outro e o usa em cerimônia de alcance mundial. Se for verdade, no meu mundo isso é um escândalo.

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