sexta-feira, julho 22, 2011

PEQUENA & GRANDE


No recanto da serra onde moro há duas padarias: uma grande, uma pequena. A grande vende pão a peso; a pequena, a quantidade. A unidade custa R$ 0,25, na pequena; na grande, R$ 0,34. Filas enormes se formam na porta da padaria pequena. As pessoas dizem que é porque o pão da pequena é mais gostoso. Mentira. Somos pobres, preço é importante, mas gostamos de justificar nossa escolha imaginando que o fazemos por causa da melhor qualidade do pão da pequena. O pão da grande também não é lá essas coisas, mas ela é tão maior do que a pequena que nem se abala com o brilhareco da menor.
Pão de qualidade não se encontra em nenhuma das duas padarias, mas, como já dito, não é isso que a choldra (obrigado, Elinho) busca. O pão é feito ao gosto da freguesia: cascudo, oco, farelento, grandão. Com pão os serranos são pouco exigentes, o mesmo não acontece quando se trata de música. A caminho da padaria, 6 da tarde, ouço escorrendo das janelas pérolas de nosso cancioneiro: “Canudo se deu bem. Mó moral, mó moral. Comprou um Ford. Ford. Ford. Ford”. Ford/fode, sacaram a rica relação? Na janela, envolvida pela música, ri a senhorinha. Afasto-me e meu ouvido funqueiro capta: “O Carvalho tá lá dentro. O Carvalho tá lá fora. Dentro. Fora. Dentro. Fora”. Percebe-se a genialidade do mesmo compositor.
A fila da padaria pequena está enorme, resolvo ir à grande. Um grupo dança em volta de uma mesa. Uma bunda ENORME desce até o chão. Não sei como a dona do rabão consegue levantá-lo, mas levanta-o com garbo. Lembrei-me do besouro. Li em algum lugar que com aquele corpão e aquelas asinhas o besouro não deveria voar. O inseto é um milagre. A bunduda também é um fenômeno. Ela só poderia ficar sentada.
Pães na mão, fui para casa. Sentei-me, liguei o som e antes de pôr os fones e ouvir uns roquezinhos, escutei, vindo do vizinho, um trecho do clássico retrofunque, na voz da veterana Tati Quebra-Barraco: “Entrei numa loja, estava em liquidação. / Queima de estoque, fogão na promoção. / Escolhi da marca Dako porque dako é bom!” Obra-prima.

2 comentários:

Catarine Heiter disse...

Estava no blog do Edgard e o nome do seu post me chamou a atenção! Gostei do que encontrei!

parabens pelo blog, pelas ideias e pela forma como escreve... fenomenal!

www.mastigandoemsalvador.blogspot.com

Ritha Torres disse...

Ler seus texto é muito bom, enriquecer meu vocabulário não tem preço. Choldra = coisa desprezível, imprestável, ralé.