sábado, agosto 15, 2009

SOMBRA

Cansamos de avisar a Lindinha, com risco de nossas vidas, que o Jeremias era rabo de foguete. Para mim ela dizia, fiada no parentesco: “Tio, você vê perigo em tudo”.
A molecada a chamava no canto e, no maior cagaço, alertava, “Lindinha, o cara mata”. No dia que Lindinha ameaçou perguntar ao Jeremias se era verdade o que dizíamos, deixamos rolar.
Nem com meu irmão comentei. Talvez ele se metesse, apesar de a covardia ser comum diante de um matador.
Bom, o romance rolou. Por uns tempos até eu ganhei prestígio. Era o tio da mulher do matador. Aos domingos, quando dava, Jeremias almoçava na casa de meu irmão. Aproveitei meu prestígio temporário e saí fora da comunidade. Falei pra mulher, “Tá na hora de ajeitarmos aquele cafofo em Maricá”.
Amor bandido dá certo quando a mulher aceita chifres. Lindinha, vi crescer. Voluntariosa, cheia de personalidade. Achava que era inteligente, mas se caiu na lábia do Jeremias...
Meu irmão ligou pra mim me perguntando se podia acolher Lindinha. Ela não queria saber mais do Jeremias e ele prometera matá-la se fosse abandonado. “Meu mano, tem gente daí que sabe que estou aqui. É bom vocês saírem daí. Vão pra casa dos primos, em Natal”.
Em Natal, Lindinha até voltou a estudar.
O Jeremias tocou o terror lá em casa, mas consegui convencê-lo que tinha rompido com meu irmão. “Se temos parentes em outras cidades? Não, não temos”.
Antes de ir embora, o animal ainda rosnou: “O dia que encontrar sua sobrinha, mato”.
Fui a uma cidade próxima para telefonar e avisar meu irmão sobre a ameaça. O medo...
O mano ficou um ano em Natal e de lá saiu com a família sem dizer a ninguém para onde ia.
Jeremias foi preso, puxou uns oito anos de cana e quando saiu apareceu lá em casa. Humilde, me pediu desculpas por tudo que havia feito minha família passar, agora era crente e só tinha amor no coração. O desejo maior era pedir perdão a Lindinha. Expliquei que não tinha contato com a família, que desaparecera no mundo. Se um dia voltasse a ver meus familiares, daria o recado. Ele me rezou, leu a Bíblia, chorou. Sei lá, fiquei achando que o cara tinha virado crente, mesmo.
Duas semanas depois abri o jornal e dei de cara com uma foto de Jeremias, morto. A mulher que o matara: Lindinha. “Minha família rodou o país fugindo desse desgraçado, essa sombra. Resolvi que era melhor acabar com ele. Ele me viu e sorriu. Dei-lhe três tiros na cara”.

Um comentário:

Anônimo disse...

hahahahahahahahaha.... krak!! Romance Policial... O Dia. hahahahahaha